segunda-feira, 25 de julho de 2011

THEY TRIED TO MAKE ME GO TO REHAB, BUT I SAID 'NO,NO,NO'...

Tentaram me mandar pra reabilitação, mas eu disse: “não, não, não”...
Dona de uma voz incrível, um rosto belíssimo e um vício terrível.
Amy se foi, aos 27 anos.
Até tentaram mandá-la pra reabilitação, mas ela disse: “não, não, não” ...
Uma das músicas que lhe rendeu um prêmio: “stronger than me”, e não essa mencionada acima, apesar do imenso sucesso e de ser um retrato bem tirado do que se passava de fato

com a vida de Amy. Mais forte que ela. Que alguém deveria ser mais forte que ela. Um pedido de suplência, de nome-do-pai, de barra.
Pedido de um socorro que venha de fora porque estar dentro é difícil demais.
Abster-se do EU, já que esse EU deixa tudo difícil de suportar. Freud já falava disso em “O Mal Estar da Civilização”, o uso de substâncias psicoativas em busca do prazer e/ou do alívio do sofrimento.
Drogas pesadas, casamento com um declarado dependente, estar fora de si. Saída. Sem dúvida
Na toxicomania, a droga é o único objeto para o indivíduo; sem deslocamento, metáfora ou metonímia, pura alienação pra fugir de uma outra. Primordial. Única saída pra uma dor insuportável, promessa de fuga da angústia onde a gente se vê, como objeto.
Back to black, de volta ao luto. Nome de álbum da cantora. Luto que talvez ela não tenha realizado, deixar de ser tudo pro Outro, e tendo que fazer isso no Real; um atentado ao próprio corpo, deixando-o impróprio para o consumo, consumo de um Outro que ameaça devorar, o tempo todo. Tentativa de colocar uma barreira ao gozo do Outro, um meio de conservar, mesmo que minimamente, a própria subjetividade.
‘Daddy’s girl’ (menina do papai) tatuado em um braço e ‘Never clip my wings’ (nunca amarre as minhas asas) no outro.

Então o cara disse: ‘por que você está aqui?
Eu disse: “não faço idéia”
Eu vou, vou perder meu amor
Então eu sempre mantenho uma garrafa por perto’.

Sempre ali, à mão, pro caso da dor.
E quando dói? Dói antes, dói depois. Só não dói durante. Quebra narcísica pós dose, espelho difícil de encarar.
E aí? Aí, dói mais.
Espelho que talvez ela tenha encarado não sem sofrimento com o passar do tempo.
Difícil de encarar, mais um motivo pra cheirar. Algo se disse inclusive sobre a aparência de Amy nos últimos tempos. Células envelhecidas, corpo mais magro e cheio de marcas. Marcas.

“Nós dissemos adeus com palavras
Eu morri uma centena de vezes”;

Talvez se Amy pudesse ter dito com palavras, não precisasse de tanto acting out. E talvez pudesse ter morrido simbolicamente, nascendo e nascendo de novo, quantas vezes fosse preciso, e não no Real, pra não voltar mais.
Fazendo pout porri de substâncias e medley de músicas, cito então a Amy:

And life is like a pipe
And I'm a tiny penny rolling up the walls inside
‘Porque a vida é como um tubo
E eu sou uma minúscula moeda rolando parede adentro’.

I didn't get a lot in class
But I know it don't come in a shot glass
‘Não aprendi muito na escola,
mas sei que as respostas não estão no fundo de um copo’.

Copo, de vinho.
Amy Winehouse. Nome bem sugestivo pra quem não ficou só na primeira taça.

quarta-feira, 20 de julho de 2011

AMIGO



Amigo é coisa pra se guardar, de baixo de sete chaves, dentro do coração. Palavrinhas eternizadas pelo Milton.
Canções, letra de música, poesia, tema de seriado.
Entrelaçamento de experiências. Identificações. E é dentro desse contexto que a vida... acontece. Cotidiano, ilusões, desilusões, amores, rompimentos, laços, dificuldades. Amizade se faz com palavras, gestos e atitudes, intimidade, liberdade.
Durante muito tempo, pensei que amizade fosse acolhimento. Um ombro pra chorar, um ouvido pra escutar e um afago quando a gente está triste.
Hoje, penso a amizade diferente. Um amigo é aquele que faz tudo isso sim, alguém que a gente pode contar, mas que também pode contar a verdade, e que pode contar a verdade pra gente. Errei? Aponta o meu erro, me fala o que eu nesse momento, não posso enxergar. Me ajuda, me mostra, me orienta. Confiança. Liberdade. Liberdade pra dizer “não gostei”, “você exagerou”,” hoje eu não quero”.
Amigo que mesmo de longe o laço se mantém. Outros que passam tempo sem se falar, mas que quando se falam, se percebe que o tempo que passou foi mero intervalo, pra deixar o show ainda mais gostoso.
Amigo de ir pra balada, de comer cachorro quente depois, de dar risada, de dançar até se acabar, de festa, de soluço, de dor, de ombro.
Bacon já dizia que “não há solidão mais triste do que a do homem sem amizades. A falta de amigos faz com que o mundo pareça um deserto”.
Deserto cor de areia, silencioso e frio. Sem dúvida, com amigos esse deserto já virava uma festa, colorida, com balões e fogos de artifício, música, abraço e felicidade. Amigos dão sentido e conforto à nossa vida.
Nos fazem mais forte, nos ajudam a passar pelos vales sombrios que a gente passa de vez em quando, incentivam, nos mostram que a gente deve seguir a diante. Porque a vida é assim, com quedas, tropeços e voltas por cima. Mas a vida, acima de tudo, é feita de relações.
Alguns dizem que “no fundo do poço tem uma mola”, acho que essa mola tem nome: amigos.
E como se constrói uma amizade? Ah, sábio Vinícius... “A gente não faz amigos, reconhece-os”.

sexta-feira, 10 de junho de 2011

DES-ENCONTRO


Lojas lotadas, programas de televisão, clínicas de estética, books sensuais.
Semana dos namorados.
Paixão.
Namoro = paixão. Pré-namoro = paixão.
Arrepio, taquicardia, necessidade.
Dopamina a mil.
Necessidade. Aumento da pressão arterial, da frequência respiratória, dos batimentos cardíacos, dilatação das pupilas, tremores, falta de apetite, falta de concentração, falta de sono, falta de memória. Falta, falta, falta.
Falta que talvez a gente possa traduzir por desejo.
Desejo - pulsão.
Borda pulsional que foi recortada pela mãe, e que é sentida tão intensamente nesse momento. Necessidade de repetição e repetição de necessidade.
Necessidade.
Dopamina a mil.
Ansiedade, hormônios a flor da pele.
Sensação de completude quando se está com a pessoa.
Completude do que? Da falta.
Ah, a falta!
A falta que a gente tem a sensação que completa.
Dopamina. Neurotransmissor da alegria pra potencializar a sensação de que o amor é lindo.
Os apaixonados ficam corajosos, dispostos a realizar novas tarefas, apesar de se dormir e comer mal. Incongruência.
Aliás, nada mais incongruente que a paixão.
Bem me quer, mal me quer.
Ele ligou? Me quer. Não ligou? Não me atendeu? Não me quer, não me quer.
Lembro um pouco do que Melanie Klein falou sobre o seio bom e o seio mal. Seio bom: me quer; seio mal: não me quer.
Rassial no seu texto belíssimo “Do amor que não seria semblante” ; retoma o dito de Lacan de que o sujeito ama aquele a quem supõe um saber. Coloca a idéia então de que o amor não é um significante, mas um signo com o qual o sujeito muda de discurso.
Imaginarização do simbólico, aquilo que encobre o que o desejo inscreve no sujeito. Encobrir. Esconder e mostrar. Joguinho instigante.
Desejo, pulsão. Algo que pulsa. Pulsação. E quanto maior o incremento da tensão, maior a descarga, maior o prazer.
Bem me quer, mal me quer. Bem me quer, bem me quer, bem me quer; em alto e bom tom. E som.
Mudamos de discurso, de posição subjetiva. E as qualidades do outro... bom... talvez seja tudo uma combinação de véu da alienação + projeção = paixão. É o meu tudo, exceto por aquilo que falta.
Falta.
Pulsão.
Véu da alienação. Joguinho de mostra e esconde. Que encontra, contorna o objeto e deixa cair. Mas que se repete.
Encontro de duas faltas. Uma sobreposta à outra. Em cima, em baixo; tanto faz. Projeção de que se eu fosse o outro, seria exatamente assim. Ah, que bonitinho, encontrar a si mesmo no outro.
Encontrar a si mesmo. Às vezes, pra encontrar a gente precisa se perder, des-encontrar, faltar.
Mas já dizia Vinícius que a vida é a arte do encontro, embora haja tanto desencontro pela vida.

domingo, 8 de maio de 2011

O QUE É UMA MÃE?

Dia das mães. Comércio em festa. Segunda maior venda do ano, só perde pro Natal. Data comemorada e lembrada com tristeza por aqueles que já perderam as suas. Tempo de reflexão. Mas afinal de contas, o que é uma mãe?
Alguns dizem que mãe é aquela que cria, outros que mãe é avó. Outros vão ainda dizer que mãe é aquela que faz. Concordo, mãe é aquela que faz... mas faz o que? Que faz o filho, literalmente? É aquela que gera? Que empresta o óvulo? Que faz doação?
Acredito que essa discussão possa ir longe, muito longe, tão longe quanto a imaginação deixar levar. Imaginação que não falha pra quem teve mãe, pra quem foi investido, pra quem se deixou fazer objeto, alienar pra finalmente se separar. Imaginário... imaginário que falha tanto na psicose, que só aliena.
Mais do que quem doa o óvulo, mais do que quem empresta a barriga, mais do que gestar. Gestar, parece até tarefa fácil pra algumas que aparecem como notícia no Jornal Nacional. Gestar sem investir é menos, gestar sem envolvimento é menos, doar a célula é menos. Gastar sem investir é menos, mas investir sem gastar, é mais. É tirar a cifra e colocar desejo. É se ver não faltante quando lança o olhar pra essa criança, é se ver plena, mesmo faltante; é se encantar com a barriguinha, com o pezinho, é se divertir com as descobertas, é encontrar ali, o seu objeto de amor, seu “tudo” mesmo que só por um pouco de tempo.
Mãe, primeiro amor de todos nós. Aconchego que a gente quer sentir de novo, de novo e de novo. Traço que marca e que a gente percorre o mundo pra sentir aquela satisfação de novo. Aquele “sou tudo pra você”. Um tudo que não é todo. Pulsão, pulsão, pulsão.
Aquela que instala a pulsão, que nos deixa desejantes, que nos faz sujeitos.
Que nos aliena no seu amor, pra separar e finalmente, a gente voltar sempre que desejar.

quinta-feira, 28 de abril de 2011

www.semespaço.com

Adoro a internet. Consultas, dúvidas esclarecidas, novidades, troca de informação.
Tantos resultados com a velocidade de menos 0,034625 segundos. Fantástico.
Hoje, tudo acontece tão rápido que não dá nem tempo de surgir a dúvida. Surgiu até um novo verbo: googlear. Alguém pergunta: “você sabe a velocidade do vôo das andorinhas?” e alguém responde: “dá um Google!”. Simples assim.
É, a vida mudou. No meu tempo de Ensino Fundamental, eu fazia minhas pesquisas nos livros da escola e na coleção linda da Barsa e Mirador que meus pais tinham/tem em casa. Era o meio mais confiável e prático de adquirir informações. De repente.... Mágica. Surgiu a Enciclopédia Digital. Toda aquela coleção imensa, que enfeitava / enfeita a estante, cabia em um CD. Excelente. Passei a fazer minhas consultas então, na enciclopédia digital.
O detalhe é que tanta facilidade e prontidão parecem ter diminuído a dificuldade e aumentado a urgência. A gente pensa nisso, faz aquilo, rápido, rápido, rápido.... e se o computador estragar: caos total e absoluto. Todo técnico em informática escuta essas palavrinhas: “NÃO POSSO FICAR SEM COMPUTADOR!”. Queixa geral de qualquer pessoa que tenha um computador. Com puta dor. Interessante.
Acabou a latência. Aquele período de espera, onde as coisas estão se elaborando, se preparando no simbólico. Os professores pra explicar isso, diziam que latência era o período de tempo que demorava para um dinossauro que teve a calda machucada sentir o estímulo da dor no cérebro. É esse tempo de “meia pausa”, onde há elaboração e preparo.
Todo mundo corre tanto hoje, que exige respostas imediatas, agilidade, rapidez e se não for pedir muito... perfeição.
Se perde alguém da família, tem que “tocar o barco”, se livrar dos pertences da pessoa que se foi, de preferência no dia seguinte ao enterro, se acabou um relacionamento o negócio é engatar outro ou outros, se tá fazendo o curso preparatório precisa ir direto pra universidade, se saiu da universidade precisa estar ganhando horrores, bem empregado. Sem intervalo, semespaço.
Dizem que o mal-estar da nossa civilização, diferente daquele que Freud fala, do homem cindido, onde disse pra Jung em sua viagem de barco: “mal sabem eles, que trazemos a peste”, veio o homem com o antídoto, centrado no Ego, onde tudo isso, essa pressão pra se realizar, realizar, realizar é tida muitas vezes com o nome de auto-estima. “você precisa se valorizar, hein?”. Uma valorização inconsistente muitas vezes, onde somos tomados pelo que nos afronta e criamos ali uma barreira, calo, escudo.
É claro que precisamos nos valorizar. Sempre. Ponto fundamental no narcisismo, impossível investirmos na vida sem investirmos em nós mesmos. Ponto oposto ao da melancolia, onde as forças são esvaídas. Pois diferente daquele mal-estar, o nosso mal estar do século XXI é apontado justamente como o tédio e a solidão. Curioso. Com os sites de relacionamento “bombando”, e a velocidade da informação chegando a 30 MB; tédio.
Semespaço pra olhar dentro de nós, nos enxergarmos faltantes, cindidos. Interessante também como nos endereços cibernéticos, não há espaço entre as palavras. Ficamos semespaço.com .
Saber que a gente pode procurar e procurar e acreditar que existe “ao menos um” que vai me deixar completo ou completa, mas saber que além de toda completude, existe uma hiância, um espaço, que mesmo semespaço, vai continuar espaçado.

quarta-feira, 2 de fevereiro de 2011

O QUE SOU?

Não sou o que pareço.
Sou o que não pareço.
Penso, logo, existo.
Existo, onde não penso.
Não; sou o que pareço.
Sou o que? Não pareço?
Penso, logo, existo?
Existo onde? Não penso.


Esses dias, escutei alguém dizer: “ando esquecendo de puxar o freio de mão do meu carro”.
Existo, onde não penso. E hesito, onde penso que sei.
O que anda precisando perder o controle? O freio? O que pára?
Freio de mão. Mecânico.
O que está tão mecânico que precisa se deixar levar... ladeira abaixo?
Ato falho.
Ou melhor, ato acertado. Falho talvez esteja sendo aquele que mantém sempre alerta, puxando o freio.
Existo onde não penso. Incoerência entre o que se pensa e o que se faz.
“Foi sem querer, querendo...” Frase de Chaves. Chaves pra abrir que porta?
Freud deu um golpe no narcisismo da humanidade, mostrando que desse modo, o homem perde o poder de Senhor e controlador de suas ações e começa uma busca incessante pela sua verdade inconsciente, que Lacan disse, se manifesta na e pela linguagem através do “unívoco”. Ops... Equívoco. O equívoco sinaliza que o homem nunca consegue dizer com precisão o que realmente sente, pois na linguagem se materializa sua marca de incompleto, de faltante; fazendo-o sempre pensar que ainda não disse tudo. E não disse mesmo. Existo, onde não penso.
Hesito, onde penso que sei. Afinal, "Não somos apenas o que pensamos ser. Somos mais; somos também, o que lembramos e aquilo de que nos esquecemos; somos as palavras que trocamos, os enganos que cometemos, os impulsos a que cedemos, “sem querer“." (FREUD, S.)
Sem querer, querendo.

quinta-feira, 20 de janeiro de 2011

O DONO DAS MENINAS

Há uma menina ao centro. Infanta Margarida aparenta pouca idade, e com seu olhar altivo, parece pertencer à figura, ou, melhor; parece refletir que é a própria figura. O resto é fundo. E mostra inclusive, o quão comum pode parecer uma tarde de sua vida sendo retratada. Suas amas ao redor, estão a servir-lhe. Uma flor no cabelo, o vestido rodado e principalmente sua postura, mostram sua grandeza. A ama

ao lado a oferece um copo d’água e se abaixa em expressão de humildade e consciência de ocupar um lugar abaixo na hierarquia. Há silêncio e mansidão. O cachorro dorme. Uma das meninas o afaga. Com o pé. Sinal de intimidade. Há um quadro na parede, de Rubens. Há dois que conversam, há alguém ao fundo; este parece conhecer o funcionamento do que acontece e supervisiona.

Este quadro, chamado “As meninas” foi pintado por ninguém menos que Velázquez. Está hoje no museu Del Prado em Madrid. E apesar de infanta Margarida ocupar o lugar central, o quadro leva este nome, pelas amas que estão a rodeá-la. O curioso do quadro é que Velázquez se auto-retrata. Está ali, no cantinho esquerdo, reparando na cena, e dando vida, contorno, luz, reproduzindo e tornando perpétua a obra.

Dizem que Velázquez se incluiu para mostrar seu valor enquanto artista.
Neste ponto, me pergunto quem é o personagem principal deste quadro.
Assim como Velázquez, pintamos nossos quadros todos os dias. Ele reproduzia o cotidiano, nós também. Pintamos vários quadros e o quadro de nossa vida. Numa pintura grande, pode ser por vezes sombria, por vezes clara. Com pessoas que entram e saem, que se curvam como as amas do quadro, e a quem prestamos reverência; por vezes figura, por vezes fundo, com muitas ou poucas cores. Por pintarmos, estamos do lado do espectador. Do lado de quem assiste e muitas vezes nos esquecemos de nos incluir na obra. Pintamos, investimos, desistimos, apagamos, borramos e isso tudo sem autoria. No entanto, quando a gente assume, erros e acertos, isso pode nos deixar mais livres, inclusive pra pintar outros quadros.

Eu sou a dona d’O Dono das Meninas.

Priscila Noro