quinta-feira, 2 de dezembro de 2010

A CIDADE DO CRISTO

Sobrancelhas levantadas, olhos arregalados, cabeça projetada para frente. Ouvidos mais atentos, arrepio, atenção exagerada, o coração bate forte, como se pudesse ser escutado; a boca seca, há tremor. Adrenalina a mil.

Medo. Palavra conhecida de quem tem vivido e observado o estado de tensão da cidade maravilhosa. Mas quem durante a história sentiu medo, estava do lado errado; éramos nós.

O pai perdeu a sua função. Cristo está de braços abertos, calado.

Com o crescimento da violência, gera-se mais violência. Não é à toa a máxima: agressividade gera agressividade.

O Estado perdeu seu poder. Não há um Outro que intervenha; que barre. Aliás, o sujeito não é barrado. Pode-se tudo, a prisão é uma “continuidade sem lei” de onde se pode dar ordens, basta ter um celular, e para conseguí-lo, vale enfiá-lo em certos orifícios. E a palavra é dada. Palavra; de merda.

Foi-se acostumando que todos têm um preço. Mas o preço... é branco.

Aonde está o Coronel Nascimento? Alguém que diga: “auto, lá!”?. Que não seja corruptível, que não tenha preço. Que não venda ideais, ou melhor, que pague o preço por eles.

Com a ação do BOPE, parece que alguém tinha que se curvar. E foram os bandidos. Numa sociedade em que não há mais nome-do-pai, nem lei, nem errado, ou melhor, um certo em que se goza por passar por cima; a era do “é ilegal, e daí?”; alguém que desse a cara, olhando pra câmera e dizendo: “nós vamos caçá-los onde estiverem”, vem como uma castração radical; sem manha, sem “se’s”. Que apaziguador, apesar da guerra.

Esses dias escutei sobre esta intervenção, e alguém disse: “as próximas gerações virão, e o tráfico continuará”. Sim, as próximas gerações virão e eu torço pra que nelas existam muitos Coronéis Nascimento ao invés de muitos Mister’s M. M daquela palavra feia, e M de mágica também, que parece fazer o coelhinho branco sumir, de dentro da cartola. Afinal, se a gente apostar que o tráfico não tem fim, estaremos admitindo nossa fraqueza de Gabriela e só nos falta sair cantando: “eu nasci assim, eu cresci assim, eu sou mesmo assim, vou ser sempre assim...”. Pode até ser que ele não tenha fim, mas se conformar com isso e fazer nada a respeito é nomear algo que não pode ser nomeado, é rotular, é engessar. E nada estaria mais engessado do que o Cristo, de braços abertos, mas boca calada.
Bater continência, se curvar diante da autoridade, prestar conta, amarrar os pontos, pontuar. Reverência, silêncio. Silêncio pra se escutar uma voz, que agora, fala.

3 comentários:

  1. Oi Pri,
    Adoro os seus textos, mas nunca cheguei a deixar um comentário.
    No entanto, este último relato gera uma comoção tão grande em meu coração que é impossível ficar "calada".
    Compartilho, exatamente, de todos os sentimentos descritos no texto, o qual você escreve com um sabor de "quero mais".
    Infelizmente, ainda temos que ouvir que os presos não podem ser privados do seu direito fundamental da privacidade. Logo, podem emitir ordens de dentro das penitenciárias por meio de seus familiares. Chega de sermos barrados pelos princípios. Estudei muito sobre uma coisa: confronto de princípios. Aí fica o pensamento: na balança da justiça, qual direito humano é mais importante: o da segurança pública ou o direito do preso de ter intimidade? Uma verdadeira democracia somente é sólida o suficiente quando é capaz de sopesar os princípios fundamentais dos direitos humanos, protegendo sua população.
    beijos
    Aline

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  2. Oi Pri td bem ???

    Acabei de ler mais um de seus belos textos ..
    parabéns pela reflexão, da mais pura verdade e realidade !

    bjinhus
    fikA cum Deus !


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