sexta-feira, 5 de fevereiro de 2010

VOCÊ TEM FOME DE QUE? A FOME DA FALTA

A falta deu o que faltar... quer dizer, o que falar.
Na última coluna, ao abordar a "insaciável insaciabilidade do ser", comentários não faltaram pra falar da falta.

O que falta? Por que falta? Falta do que? Falta ter ou falta não ter?

Pois então, frente a todas estas perguntas, a devolvo: "o que é essa falta que não cessa frente ao objeto que eu escolhi para tamponar o que falta em mim?".

Os bebês de colo se pudessem falar horas depois que nascem, contariam histórias enlouquecedoras, tenho certeza. Primeiro, o bebê nasce. Logo que conhece as luzes do mundo externo, lhe é dado o seio; a mãe lhe ordena: "-mame!". Imperativo, ordem de um outro grandão. Enquanto ele ainda não sabe o que é boca, nem seio, numa tentativa meio cega e inteiramente tumultuada, descobre que é a boca que deve envolver o seio. Ok! Muito bem! Mamãe, esse outro grandão sorri pra mim e sinto que ela fica feliz.
- "Cumpri minha missão". pensa o bebê. Porém, assim que pego o jeito da mamada, sou arrancado do peito e começam a me socar as costas, o que é isso? Sei lá, um mal-estar, uma pressão, algo estranho, esquisito (bom, até agora, nada tem sido menos do que esquisito), até que um arzinho sai da minha boca. Opa! Mamãe, o mesmo ser que me coloca o peito na boca e me soca nas costas deu um sorriso. Acho que ela está feliz de novo! Não bastasse todo esse ritual, agora ela quer que eu durma, que eu acorde que eu dê um sorrisinho, que eu faça xixi, que eu não chore, que eu durma de novo, que eu acorde, que eu mame no peito, que eu me entretenha com o bichinho, que eu durma no bercinho que eu tome o suquinho, que eu engatinhem que eu dê os primeiros passos, que do bê-a-bá eu passe para as palavras, que eu me forme, que eu tenha sucesso, seja rico, trabalhador, não respondão, cativante, estudioso, responsável, educado, grato e feliz! Só isso.

Com tanta demanda, só enlouquecendo, ou se estruturando de uma vez.

É todo esse desejo da mãe, que no momento em que é preenchido, ela muda de idéia, e fala: "agora não é mais isso", que do dormir passa para o acordar, que do comer passa para o brincar, que do engatinhar passa para o andar, é toda essa falta NA MÃE; falta, porque ela demanda o tempo todo que seja preenchida e que o bebê tenta preencher, que dá a estruturação necessária pra que ele possa sim, mamar, dormir, acordar, brincar, não chorar (e chorar de vez em quando também), engatinhar, andar, falar, estudar, se formar, trabalhar, e tentar... ser feliz.
É o desejo desse Outro Grandão que me estrutura e que me constitui. E é sempre esse "tem algo faltando", o responsável por permitir que eu tente preencher e que não preencha de verdade, porque se for completo e pleno demais, não sobra espaço pra faltar de novo e fazer tudo circular.

A vida deve ser um mau encontro.
Aquele que sempre deixa a gente com sensação de quero mais, o que a gente acaba por perceber que de mau, não tem nada. É o mau / bom
encontro.

Porque se for demais, vira overdose, e tudo que é over, é dose!

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