quarta-feira, 30 de dezembro de 2009

ANO NOVO, DESEJO NOVO

Adeus ano velho, feliz ano novo... que tudo se realize, no ano que vai nascer, muito dinheiro no bolso, saúde pra dar e vender!

É, não é a toa que essa musiquinha insiste em comparecer todo ano às vésperas de um novo ano. Então, será que ela é desejo? Porque se eu quero que tudo se realize, mas no ano seguinte continuo cantando, quer dizer que não realizei, certo? Ou será que ela é um simples dito pra que a gente não perca as esperanças? Por que será que nunca estou completamente satisfeito com o que me ocorre?

Se comprei um carro bom este ano, no ano que vem quero outro, quero dois, quero mais. Se conquistei a casa dos meus sonhos, ano que vem quero reformá-la, colocar novas cortinas, novos móveis, cara nova. Perpétua e insaciável insatisfação. O desejo pode aparecer inalcançável num primeiro momento; aí eu luto, luto, luto e o consigo. E quando consigo, digo: “puxa, não era bem isso”. Mau encontro, sempre.

Que bom que é assim. Já imaginou se a gente se aquietasse com um brinquedinho novo? Ou se, por curtir o filho pequeno, desejasse que ele jamais crescesse? Ou, por saber que a gente vai ter trabalho limpando a cozinha, não chamasse os amigos pra fazer a festa? Bendito laço esse que permite que pelo menos por alguns instantes, eu acredite que aquele encontro vai me fazer bem, vai me deixar melhor, vai contribuir, vai saciar. Pior seria se a gente falasse: “bom, já que não é isso que vai resolver, então, não vou nem investir, vou ficar na minha, vou tocar o barco, não vou depositar esperanças já que elas são vãs”. Que dificuldade de encarar o vão, o simples, o sem objetivo imediato. Parece que durante tanto tempo vivemos em busca de algo como trabalhar para ganhar dinheiro, conversar para conseguir alguma conclusão, dirigir para chegar; que esquecemos que vivemos... para morrer.

Ano velho, quase começo do novo, hora de fazer uma retrospectiva, e não aquela que já vem pronta na televisão. Hora de pensar no que não gostei do ano velho e do que não quero repetir no ano novo. Objetivo de novo? Sim, mas vamos combinar que este talvez seja mais proveitoso. E que talvez esse sim, tenha um propósito menos proposital. O propósito de me deixar aproveitar mais a jornada, porque o destino... bom, dele falamos, algumas linhas antes. Sabemos aonde acaba o destino da vida. E o que é o propósito dela, se não o de deixar o desejo aflorar e permitir novos enlaces, novos maus encontros, novos êxtases, nem que sejam por um momentinho só?

Que a gente conquiste não o que quer, mas o que deseja. E com isso, termino este ano, com o mesmo tema em que inaugurei esta coluna. A diferença entre o querer e o desejar. Que o que aconteça no ano novo, seja da ordem do desejo, aquilo que eu não controlo, aquilo que simplesmente aparece porque é verdadeiro.

Afinal, querer não é poder, mas desejar é.

quarta-feira, 23 de dezembro de 2009

FELIZ LOUCURATAL

O tempo é de festa. A época mais esperada do ano. É natal!

Tempo de descanso, reflexão e nostalgia. Tempo de pensar no que passou, no que se fez, no que virá. Tempo de festejar com a família, de aproveitar os momentos juntos, tempo de pensar em quem fez ou não diferença. Religioso ou não, natal é natal, e o que a gente aprende é que é tempo de valorizar as pessoas.

Estranho? Fora da realidade? Utopia?

Enquanto escrevo essas linhas, penso no quanto isso está distante da nossa realidade. Semana passada, fui ao shopping. Além de enfrentar um trânsito infernal, parado no calor de pleno dezembro; filas e mais filas, lugares excassos para estacionar, empurrões, correria, obrigações. Em nada isso parecia com a descrição do natal das primeiras linhas; ao invés de um feliz natal, parecia mais uma loucuratal.

Quando pequena, não vou negar, esperava ansiosa o natal chegar, adorava os presentes! Mas tudo isso era feito em família; o jantar, a arrumação, e é claro que as crianças estavam preocupadas absolutamente com a chegada do bom velhinho, e ele sempre chegava! Às vezes era um amigo de família, às vezes algum tio, às vezes o vovô, mas ele sempre vinha; o bom velhinho não falhava jamais! É natural que as crianças pensem no papai-noel às vésperas das festas e tudo o mais. É alegre, é contagiante, é bom. Mas é um presságio. Já que na infância, a gente aprende tudo através mundo concreto, aquele que se pode pegar, que seja assim; através de presentes, pra que a gente se dê conta depois do verdadeiro significado, que exige mesmo, certa abstração.

O fato é que os adultos parecem também estar embarcando nessa. O importante é ter. Quanto mais se compra menos a gente pensa, então; compremos. O vazio é ruim demais de suportar, então a gente enche os dias de afazeres, mesmo que eles já tenham terminado.

O comércio é imperativo: compre, compre, compre. Gaste, gaste, gaste. Quanto mais você gastar, mais pontos vai acumular pra ganhar um “não-sei-o-que”. Compre, compre, compre. Parcele, parcele, parcele; não esqueça, não esqueça, não esqueça. Com o ano todo, aprendemos a ser objetivos, a mostrar resultados, a não perder tempo. E quando chega o natal, estamos tão loucos com a famosa correria de dezembro que quando as coisas acabam, encontramos ainda mais motivos para não parar. Como robozinhos, seguimos na sedução das propagandas e nos hipnotizamos com a promessa de que quanto mais temos, menos vazio sentimos.

Fico me perguntando, se no meio disso tudo, a gente sabe mesmo o que fazer com uma tarde vã. Aquela, em que o trabalho acabou, quando sobra algum tempo pra gente parar um pouco... parar e curtir o entardecer, abraçar sem que seja em troca de um presente, abraçar por abraçar, conversar por conversar, rir por rir. Esses momentos em que a gente fica curtindo, um bate-papo, um carinho, um olhar.

Que o natal seja mais natal e menos louco. Que a gente possa aproveitar um pouquinho que seja aquelas coisas que não se podem comprar, nem com mastercard.

quinta-feira, 17 de dezembro de 2009

TIC SUÍÇO, TAC PESSOAL

Ah, os suíços! Se um suíço fala que estará na frente da sua casa às 17h34, acredite: ele estará. Não é a toa que a fama é mundial e que os relógios suíços são conhecidos globalmente. O tic-tac de lá funciona mesmo, sim senhor. Parece impossível, mas a precisão é precisamente precisa. Se pego um ônibus na Suíça que diz que às 13h54 estará em tal ponto, pode apostar: dito e feito.

Pensando bem, o tic-tac de lá é o mesmo tic-tac daqui. O tempo cronológio é sempre o mesmo. Todo dia tem 24 horas, todo ano tem 365 dias e a cada 4 anos tem o ano bissexto. Pra todo o mundo, as horas têm 60 minutos, não interessa se aqui está amanhecendo mais cedo e escurecendo mais tarde, se os dias estão mais curtos como no inverno ou mais longos como no verão. O cronos é suíço, brasileiro, americano, africano, tailandês.

Tem pessoas que vivem no compasso como o tic-tac de um relógio.

Com 2 entram na escolinha, com 7 na primeira série, com 17 terminam o terceirão, ainda entram na faculdade, com 22 se formam, com 27 casam. Com 29 tem o primeiro filho, com 30 compram a primeira casa; tic-tac, tic-tac.

Mas tem coisas na nossa vida que não podem ser cronometradas com toda essa precisão. Existe um tempo lógico dentro de nós que anda em outro compasso, e nada tem a ver com o tic; talvez com o tac. Professores de pré-escola sabem muito bem disso. Ensinam as letrinhas aos baixinhos, ensinam a formação de sílabas, e lá vem uma palavra inteira. Ótimo. Mas podem perguntar pra eles; alguns aprendem antes, outros depois. Famoso “insight”. O resultado de alcançar a íntima natureza das coisas ou de perceber de uma maneira intuitiva. Algumas crianças entram na pré-escola já sabendo algumas palavrinhas; outras, só terminando o ano. E o conteúdo dado na escola foi o mesmo. O mesmo tic, não o mesmo tac. Tac, famosa iluminação, eureka, estalo!

O tempo cronológico angustia. Quantas vezes falamos pra nós mesmos “o tempo está passando”, e como todo mundo sabe, mas que a gente custa a aceitar, ele não volta. Nunca mais. E como o ponteiro do relógio, não adianta segurar. É imperativo. Ele passa, queira você ou não.

Nosso tempo lógico opera diferente. É a assimilação das partezinhas que um dia se juntam, e, quando se juntam, TAC! É quando a gente pode ver as coisas com mais clareza, quando percebe o que estava obscuro, quando compreende e conclui. Lembra do livrinho “Onde Está o Wally?”, tudo parece confuso, uma miscelânia de informações e, de repente, o Wally aparece no meio de tudo aquilo. Uma vez visto, não se esquece jamais. Você pode olhar pra página várias vezes, tentar se confundir de novo, mas não; uma vez percebido, você sabe que jamais poderá se enganar achando que ele não está lá onde achou. Ele surge como uma pipoca estourada no meio de um monte de grãozinhos.
Cada um tem um tempo pra achar o seu Wally. Pra alguns pode parecer mais óbvio, para outros, mais escondido. Mas ele está sempre lá. Esperando meu instante de ver, o meu tempo para compreender e o meu tempo de concluir.
O tic é do outro; o tac é meu.

quinta-feira, 10 de dezembro de 2009

ALE, SEM MANHA

A Alemanha é um país conhecido pela organização. E de fato, são organizados mesmo. Gostam de uma boa cerveja (também são conhecidos por isso), e são trabalhadores. Conhecida como uma grande potência, participou das duas Grandes Guerras. A primeira, foi motivada entre outras razões; pela partilha de terras da Ásia e África. A Alemanha, no entanto, sentiu-se prejudicada pela divisão, pelo pouco que havia recebido, e decidiram que queriam mais território e igualdade; foi assim que Alemanha, sem manha nenhuma, se colocou na linha de frente contra uma situação que não concordava. Decidiu ir à luta.
É claro que a guerra, de fato, deixa muitas cicatrizes. Mortes, sofrimento, questionamento da justiça. Mas se tem algo que você pode ver quando vai à Alemanha, são as marcas que a luta imprimiu neste povo. Quando existe guerra, as pessoas são obrigadas a se unir, a lutar pelos seus ideais, a se ajudar, a se a ver com suas fraquezas e seguir em frente, encarar os pontos fracos, mas também, potencializar os fortes.
Muito se aprende com a luta. Ela deixa marcas. Não se passa impune, todos se deixam cindir. E é essa cisão que pontua, que coloca as coisas nos seus devidos lugares, que posiciona, que mostra o caminho, que norteia.
A Alemanha é a terceira economia do mundo. O que prova que é o tamanho da força e não do território que faz a diferença. Ela sabe das suas fronteiras, sabe que não é tão grande. No entanto, é por causa dessas fronteiras, que eles sabem que o que está fora, está fora; mas o que está dentro, está dentro pra valer. Sabem o que tem e o que fazer com o que tem. Quando se vai à Colônia, uma cidadezinha bonitinha de lá, dá pra se ver uma igreja que tem mais de 700 anos, e demorou mais de 600 para ser completada. Com as guerras, parte dela foi destruída. No entanto, no mesmo momento em que a guerra terminou, a reconstrução começou. Ela sobreviveu; à primeira e à segunda. Até hoje, ela é sempre cuidada e reformada, a construção é contínua. Assim como é a gente. Assim como é a vida de quem luta. De quem sem manha corre atrás, de quem sabe que a reconstrução pode não acabar, mas que mesmo assim, sabe que desistir sim, é acabar de vez. É aí que está a sua inteireza.
Muitas vezes, temos que nos deixar cortar, cindir, machucar. Nada fácil. No entanto, são esses cortes, que quando cicatrizam, fazem com que a gente saiba por onde caminhar. É com a queda do muro, como o de Berlim. Antes, a Alemanha dividiu-se em duas. Divisão física, visível, palpável. Cisão. Mas com a queda do muro, ela voltou a ser uma só. Coesa.
Lembro então de uma frase da Cecília Meireles que diz: “aprendi com a primavera e me deixar cortar para poder voltar sempre inteira”. Quando a gente se deixa cindir, a gente renuncia; renuncia um caminho, o caminho que deixou; abre mão. Mas o caminho que a gente escolhe pra trilhar, pode ser muito mais claro. O que ficou pra fora, ficou fora mesmo, não adianta mais chorar; mas o que restou, é a sua propriedade, é o próprio, é o meu, o meu de verdade, e posso fazer com ele, o que aprendi com a queda, e do que restou; me reconstruo. Afinal, é em torno da falta que a gente se funda, e sabendo o que se perdeu, a gente sabe também, o que ganhou.

sexta-feira, 4 de dezembro de 2009

É LONDRES, MEU BEM!

Londres é uma cidade cosmopolita. Na rua você encontra londrinos, indianos, nova iorquinos, brasileiros, italianos. Todo mundo fala inglês, e todo mundo fala inglês com seu próprio sotaque. Tudo bem. Acentos à parte, a gente se entende.
Londres é também a sede de vários pontos turísticos incríveis. A começar pela própria cabine telefônica, que eu considero um ponto turístico especial, encontrada em cada esquina de Londres, mas conhecida em todo o mundo. Sim, é aquela cabininha vermelhinha, com vidro em moldura retangular. Fofa. Londres tem também uma forte influência na política, finanças, educação, entretenimento e mídia, e é em Londres que estão sediadas também as mais importantes empresas da Inglaterra. Ah, sem contar a rainha... que traz sempre um glamour a mais para a cidade. Mas apesar de todos estes atrativos, o que me levou a Londres dessa vez, não foi a rainha ou o Big Ben. O que me levou a Londres dessa vez foi uma pessoa. Uma pessoa muito especial, que me conhece desde que eu nasci. É legal falar isso. É interessante também. Será que a pessoa que conhece a gente desde que a gente nasce nos conhece melhor do que a gente mesmo? Talvez sim, talvez não.
Tem pessoas que nos conhecem melhor do que a gente. E tem pessoas que só de nos ouvirem, escutam melhor do que a gente o que está passando na nossa cabeça. Quando a gente está envolvido em algum problema, ou situação, às vezes não consegue enxergar muito bem o que se passa. Ficamos à mercê. À mercê dos sentimentos, à mercê das relações. À mercê do lugar que ocupamos, simplesmente (ou não tão simplesmente assim), à deriva. Em Londres, aconteceu uma coisa que mudou a vida da pessoa que me conhece há tanto tempo. Em Londres, ela conheceu alguém, e ficou à deriva. Alguém que mudou a vida também por causa da pessoa que me conhece. Confuso, né? Bom, pra resumir, eles mudaram suas vidas porque se conheceram.
Interessante como tem coisas na vida que escapam do nosso controle. A história desse casal, que se conheceu em Londres, começou por acaso, como eles mesmos contam, sem a menor pretensão de acontecer. E isso me lembra aquela música do Lulu, que diz: “eu gosto tanto de você que até prefiro esconder, deixo assim ficar, subentendido... como uma idéia que existe na cabeça e não tem a menor pretensão de acontecer”. Talvez tenha sido assim. Sem a menor pretensão de que aquele simples cumprimento, que aquela simples conversa fosse virar amor. E assim, continua a música com a parte: “pode até parecer fraqueza, mas que seja fraqueza, então... a alegria que me dá isso vai sem eu dizer”. Acho que é assim que eles se sentem. Porque o que nos acomete como sentimento, foge ao controle. Londres pra eles, tem um lugar muito especial no coração, o que acaba chamando pra lá, muitos que estão envolvidos com eles, afinal, foi lá, que o inesperado sem pretensão aconteceu, mas a diferença, é que podia ser Londres, podia ser Nova Yorque, podia ser a Índia. Pra eles Londres pode mudar, mas o “meu bem”, não.